Estudo da Oceana aponta fragilidades na atual legislação criada há mais de 10 anos
Lançada neste segundo semestre pela Oceana, a nova edição da Auditoria da Pesca mostrou que o país avançou no grau de conhecimento sobre a situação da metade dos estoques pesqueiros da frota comercial no Brasil. O estudo também indica a necessidade de se revisar e aprimorar a atual Lei Nacional da Pesca (nº 11.959/2009).
Desde 2020, primeiro ano da análise do panorama da pesca por meio da Auditoria, o marco legal da Política Pesqueira no país permanece sem alterações. As fragilidades no texto dessa lei dificultam um desenvolvimento sustentável da pesca no país. “É preciso destacar que a Lei da Pesca apresenta muitas lacunas de atribuições e competências, gerando um quadro de governança muito instável”, destaca Martin Dias, oceanógrafo e diretor científico da Oceana.
A análise da atual Lei da Pesca revela oito razões que comprovam a urgência do aprimoramento dessa legislação. São elas:
- O atual marco legal favorece a instabilidade e a descontinuidade na gestão da pesca;
- Ela estabelece uma política sem estrutura, tanto no sentido da geração, organização e disponibilização de dados, quanto no que se refere à estrutura institucional e de processos e regramentos;
- Não atribui responsabilidades à autoridade pesqueira e não vincula a competência do manejo a nenhum órgão ou instituição;
- O marco legal é tímido em seus objetivos, que deveriam ser claros e de amplo espectro, de acordo com a complexidade da atividade pesqueira no país;
- A legislação é vaga quanto às definições técnicas, não determinando conceitos importantes ao desenvolvimento da pesca sustentável;
- A atual lei da pesca não planeja a pesca a longo prazo, sem a previsão de planos de gestão, acordos de pesca e outras ferramentas de planejamento;
- Ela é centralizadora, o que resulta em baixa autonomia administrativa para os demais entes da federação e em um sistema contraproducente diante de um país com as dimensões e a diversidade do Brasil;
- O atual marco legal não prevê recursos orçamentários para sua implementação, tanto no aspecto humano quanto financeiro, essenciais para a gestão pesqueira.
“Há um cenário de incerteza quanto à manutenção no funcionamento do conjunto de Comitês Permanentes de Gestão, ao acesso e disponibilização de dados e informações, aos processos de revisão e publicação dos regramentos para a pesca e à continuidade de projetos de pesquisa e programas de monitoramento pesqueiro. Como nada disso consta em Lei, são questões passíveis de mudança, como se a cada ciclo de governo precisássemos refundar estruturas e processos que já deveriam ser mais estáveis diante da importância do setor pesqueiro para o Brasil”, explica Martin Dias.
Nesse sentido, a Auditoria da Pesca 2022 sugere que a revisão da Lei da Pesca observe pontos como o estabelecimento de definições técnicas mais precisas e de atribuições e responsabilidades específicas a usuários de recursos e órgãos gestores; a criação de estruturas de Estado com estabilidade institucional; a previsão para que a gestão da pesca se dê por meio de instrumentos como Planos de Gestão; além de processos mais claros para participa participação social nas tomadas de decisão.
Estoques Sobrepescados
O principal estudo sobre a situação da gestão pesqueira nacional, a Auditoria da Pesca teve sua terceira edição lançada em julho deste ano pela Oceana. O documento aponta um salto no conhecimento sobre a situação dos estoques pesqueiros marinhos, fruto dos resultados de pesquisas realizadas com recursos públicos por cientistas de diferentes instituições do país. Apesar do avanço, uma parte expressiva dos recursos pesqueiros brasileiros ainda é explorada sem que se conheça a sua situação biológica, o que representa riscos ambientais e socioeconômicos.
A edição anterior da Auditoria levantou a existência de informações científicas sobre o estado de apenas oito estoques pescados comercialmente no país; na atual análise, esse número saltou para 66 espécies. No entanto, os novos dados revelam uma situação alarmante: desses estoques para os quais existem informações disponíveis, 67% encontram-se sobrepescados, ou seja, suas populações encontram-se abaixo dos níveis de segurança para manutenção de pescarias sustentáveis. Estão, portanto, numa zona de risco biológico o que, inclusive, prejudica o rendimento econômico atual e futuro das pescarias.
É o caso de espécies amplamente conhecidas, como corvina, castanha, polvo e o camarão rosa das regiões Sul e Sudeste; e olho-de-boi (arabaiana), pescada amarela e xaréu capturados no Norte e Nordeste do país.
Modernização
A necessidade de atualização da legislação pesqueira no Brasil vem sendo amplamente discutida pela Oceana por meio de uma série de ações. Foram realizadas mais de 10 encontros com setor pesqueiro artesanal para debater um novo marco legal e lançado o relatório A Política Pesqueira no Brasil, com uma minuciosa análise sobre a política de pesca do país.
Fonte: https://www.portaldoagronegocio.com.br/