Produção em escala do tambaqui e industrialização de coprodutos da tilápia podem tornar o Brasil mais competitivo na piscicultura

Pesquisador em Economia e Gestão da Inovação na Embrapa Pesca e Aquicultura, Manoel Xavier Pedroza Filho afirma que o tambaqui está ganhando cada vez mais espaço nas exportações, no entanto, é necessário que o setor se estruture para oferecer esse produto com regularidade e em escala.

Existe uma variedade de peixes nas águas doce e salgada que contornam o vasto território brasileiro, mas a espécie que tem sido protagonista da produção nacional é a tilápia, um dos pescados mais cultivados no país e que vem conquistando cada vez mais o mercado, o paladar e o prato de muitos brasileiros e estrangeiros. De acordo com a Associação Brasileira de Piscicultura (Peixe BR), o Brasil é o quarto maior produtor mundial de tilápia, espécie que representa 65,3% da produção nacional.

A produção aquícola no Brasil tem testemunhado um crescimento expressivo ao longo dos últimos anos. Segundo dados da Peixe BR, o país registrou 638 toneladas de peixes produzidos em 2015, número que saltou para 887 toneladas em 2023, crescimento superior a 39% no período. “O cultivo de peixes em água doce representa 86% da produção nacional, camarão possui 13% e ostras, vieiras e mexilhões contribuem com apenas 1%”, expôs o doutor em Economia, mestre em Administração e Desenvolvimento Rural, engenheiro agrônomo, professor e pesquisador em Economia e Gestão da Inovação na Embrapa Pesca e Aquicultura, Manoel Xavier Pedroza Filho, durante o Inovameat, um dos principais eventos de proteína animal do Paraná, realizado no início de abril, em Toledo, no Oeste do Paraná.

Indústria em ascensão

A piscicultura brasileira tem se destacado como uma indústria em ascensão, com um aumento significativo na produção e nas exportações nos últimos anos. Mais de 20 espécies de peixes são cultivadas no país, com a tilápia liderando esse mercado, representando 65% da produção, seguida por tambaqui, tambacu, tambatinga e carpa, juntas somam 14%. Outras espécies, como pintado, cacharam, cachapira, pintachara, surubim, pacu e patinga compõem 1% cada, enquanto 13,7% são de outros peixes.

Entre 2015 e 2023, a produção da piscicultura registrou um crescimento superior a 39%, mantendo uma média anual de 4,87%. “Esse aumento reflete o compromisso e o investimento dos produtores brasileiros no setor”, pontua Pedroza Filho.

Os principais estados produtores de piscicultura no Brasil são Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Rondônia, Santa Catarina, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Bahia e Pernambuco. “A estrutura de governança na cadeia produtiva da piscicultura é caracterizada pelos sistemas de produção individual, verticalizado e integrado, com a predominância dos dois últimos, o que permite uma gestão mais eficiente e uma maior qualidade do produto final”, afirma.

Exportações

As exportações da piscicultura brasileira aumentaram 4% em valor, em 2023, totalizando U$S 24,7 milhões. Em toneladas, houve queda de 20% (6.815 toneladas), aponta a Embrapa Pesca e Aquicultura a partir de dados do ComexStat, do Ministério da Economia. Quando incluído os pescados nesta contagem, as exportações alcançaram 120.659 toneladas no último ano, resultando em uma receita de US$ 415 milhões.

O crescimento das exportações em dólar e a queda em toneladas são explicados pelo crescimento das vendas de itens de maior valor agregado, como filés frescos. O aumento dos embarques de filés frescos e a queda dos peixes inteiros congelados – que possuem menor preço – representam os principais fatores responsáveis pelo aumento do valor médio por kg do produto exportado. Entre o terceiro trimestre de 2021 até o último trimestre de 2023, o preço médio da tilápia inteira exportada aumentou 21,2%, passando de US$ 3,49/kg para US$ 4,23/kg. No mesmo período, o preço médio da tilápia no mercado interno aumentou 33,4%, passando de R$ 7,29/kg para R$ 9,73/kg.

No ano passado, as exportações de peixes por espécies revelaram um panorama diversificado no mercado internacional. A tilápia continuou a liderar como a maior espécie exportada, representando 94% das exportações totais. Este peixe gerou uma receita de US$ 23 milhões, registrando um modesto crescimento de 1% entre 2022 e 2023.

Por outro lado, o tambaqui aumentou sua participação no mercado em 809%, atingindo 3% das exportações e gerando uma receita de US$ 798 mil. O bagre e os surubins também contribuíram, representando cada um 1% das vendas externas, com receitas de US$ 234 mil e US$ 224 mil, respectivamente, embora os surubins tenham registrado uma queda de 16% em comparação com 2022. As curimatás e outras espécies ainda têm um volume inferior a 1%, mas movimentaram US$ 119 mil no último ano.

O Paraná manteve a posição de maior exportador brasileiro de tilápia em 2023, com US$ 18,6 milhões, representando 80% do total. Na segunda posição aparece São Paulo, com US$ 2,7 milhões (12% do total), seguido pela Bahia, com US$ 1,3 milhão (6% do total). O Paraná foi o estado exportador que apresentou o maior crescimento nas exportações de tilápia em 2023, representando um aumento de 42%. “Esses estados desempenham um papel importante na oferta global da tilápia brasileira, atendendo à crescente demanda tanto dentro quanto fora do país”, enaltece o palestrante.

Do total exportado, 60% consistiu em filés frescos, 26% de tilápia inteira congelada, 5% de filés congelados, 7% foi composto por subprodutos impróprios para alimentação humana e 2% foram de tilápia inteira fresca. “Essa diversificação na oferta de produtos de tilápia ressalta a capacidade da indústria brasileira de adaptar-se às necessidades e preferências dos consumidores internacionais, consolidando a posição do Brasil como um dos principais fornecedores globais da tilápia”, exalta o profissional.

Principais destinos

O Estados Unidos seguiu como principal destino da tilápia brasileira, importando 91% do total, em 2023, totalizando US$ 21,2 milhões e crescimento de 13%. A China foi o segundo destino, com US$ 673 mil e crescimento de 168%, seguido pelo Japão, com US$ 493 mil e crescimento de 183% em relação a 2022. Além destes, outros países também figuram entre os principais importadores da tilápia brasileira: Taiwan com 334.7 toneladas, Canadá com 189.6 toneladas, México com 107.2 toneladas, Malásia com 60.9 toneladas, Libéria com 46,3 toneladas, Ilhas Marschall com 38.9 toneladas, Paraguai com 30.7 toneladas, além de outras nações que importaram juntas 162.8 toneladas. O Brasil manteve a sétima posição no ranking dos exportadores, com uma receita de US$ 20,9 milhões, e crescimento de 12%. “Esses números destacam a diversificação dos mercados de exportação da tilápia brasileira, demonstrando a sua relevância global e a capacidade do Brasil de atender à demanda de diversos países”, frisou o pesquisador da Embrapa Pesca e Aquicultura.

Drawback impulsiona competitividade

A tilápia foi o primeiro produto da aquicultura a ser inserido no sistema de Drawback para exportação, em meados de 2019. Conforme Pedroza Filho, essa iniciativa trouxe benefícios significativos às empresas exportadoras, permitindo a desoneração dos insumos utilizados no lote exportado, entre os quais ração, alevinos, vacinas e, mais recentemente, as embalagens para filé. “Essa medida visa reduzir os custos de produção e tornar a exportação de tilápia brasileira mais competitiva nos mercados internacionais”, expôs, evidenciando que os impactos econômicos dessa política resultaram em uma redução de cerca de 10% no custo de produção para os produtores da espécie.

Desafios e oportunidades

Pedroza Filho enumera alguns desafios enfrentados pela indústria de exportação de tilápia, que incluem a necessidade de adequação às exigências sanitárias e legais estabelecidas pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) e pelos países importadores, atrelado a complexidade das transações comerciais, logística, financeira e aduaneira, bem como aos padrões de qualidade e certificações exigidos pelos mercados internacionais, como as BAP, ASC, BRC e GlobalGap, além da criação de uma política nacional de biosseguridade para a piscicultura. “Cumprir esses padrões é fundamental para garantir a competitividade e a aceitação dos produtos brasileiros no exterior”, reforça, destacando que o padrão de qualidade para o corte de filé de tilápia fresco no mercado interno é shallow skinned (pele fina), enquanto para o mercado externo é deep skinned (pele espessa).

O pesquisador afirma que o tambaqui está ganhando cada vez mais espaço nas exportações, no entanto, é necessário que o setor se estruture para oferecer esse produto com regularidade e em escala. “Nas feiras em que se leva a costelinha de tambaqui esse produto tem uma boa aceitação”, enaltece.

No entanto, apesar dos desafios, existem diversas oportunidades que podem ser exploradas pelo setor. Pedroza Filho diz que a produção de subprodutos como farinha, óleo, gordura e pele, apresenta um grande potencial para agregar valor à indústria da tilápia. Além disso, abertura de novos mercados para os peixes nativos e a introdução de novos cortes da tilápia podem diversificar as opções de exportação e aumentar a presença dos produtos brasileiros mundo a fora. “Um exemplo do potencial dessas oportunidades é o crescimento expressivo na exportação de gordura e óleos de peixes, que registraram um aumento de 827% em 2023. A farinha de peixe também teve um crescimento significativo, com o preço variando acima de US$ 1,7 mil a tonelada entre fevereiro de 2023 a fevereiro de 2024, indicando uma demanda crescente por esses produtos no mercado internacional”, enfatizou, salientando: “O governo e o setor devem continuar a explorar o mercado europeu, que é vasto e ainda não foi completamente explorado, assim como focar no crescimento das exportações de peixes nativos”.

O pesquisador destaca a possibilidade de aumento das importações de tilápia, não apenas do Vietnã, que por ora segue suspensa, mas de outros países, representando um risco para o setor. Contudo, ele enfatiza que, se o país seguir as medidas sanitárias, não há impedimento para a exportação dessa tilápia para o Brasil. “O principal desafio que identifico é a necessidade de o setor se preparar e tornar-se competitivo, uma vez que, no ponto de venda, o consumidor tende a basear sua escolha no preço, independentemente da origem do produto”, avalia, apontando que o alto custo do filé de tilápia limita seu acesso a todas as camadas sociais, ressaltando a importância de adotar medidas de controle sanitário e de tornar o produto mais competitivo no mercado interno.

Como se tornar mais competitivo

O especialista diz que para tornar-se mais competitivo, o setor pode se inspirar na cadeia produtiva do Oeste do Paraná, que se destaca pelo modelo de integração e pela intensificação da atividade em viveiro escavado, alcançando uma produtividade superior a 30 quilos por metro quadrado. “Essa região é reconhecida por produzir a tilápia mais competitiva do Brasil. O desafio em outras regiões é que a maioria dos produtores opera de forma individual, sem estar organizada em cooperativas ou integrada a um sistema, sendo necessário que toda a cadeia adote esse modelo para alcançar maior competitividade”, reforça.

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Fonte: O Presente Rural