Renúncia coletiva de comitê de atuns expõe descaso federal com os estoques pesqueiros

Renúncia coletiva de comitê de atuns expõe descaso federal com os estoques

No entra e sai de ministérios e secretarias, muitas vítimas ficaram pelo caminho. Uma delas é a reputação do Brasil no gerenciamento global dos estoques pesqueiros, que agora ganha novo golpe com a renúncia coletiva de todos os membros do Subcomitê Científico do Comitê Permanente de Gestão dos Atuns e afins (SCC-AA).

O setor privado apoiou a decisão. “A decisão de renunciar é o mais fiel retrato da falência da gestão pesqueira nacional; o Conepe entende e apoia irrestritamente tal decisão por entender que estes profissionais e colaboradores tiveram o limite de sua paciência, comprometimento e honradez ultrapassado”, disse em carta o presidente do Coletivo Nacional da Pesca e Aquicultura (Conepe), Alexandre Espogeiro. (Leia aqui a carta completa)

Em um ofício enviado ao secretário da aquicultura e pesca, Dayvson Franklin de Souza, o professor Dr. Paulo Travassos, presidente do subcomitê, enumera as razões pelas quais o órgão consultivo, criado há quase 20 anos, anuncia ali a paralisação das atividades.

Entre as razões elencadas (confira todas aqui), o professor aponta o colapso da estatística pesqueira como fator determinante. “O último boletim estatístico publicado pelo MPA [Ministério da Pesca e Aquicultura] foi o de 2011,não havendo dados oficiais consolidados desde então.” O SCC-AA desempenhava suas funções com apoio em um conjunto de informações estatísticas e biológicas das espécies capturadas, para definir políticas de gestão da atividade e conservação dos recursos explotados.

No caso específico do atum, há um agravante. O Brasil é membro fundador da Comissão Internacional para a Conservação do Atum Atlântico (ICCAT) desde 1967, o que implica responsabilidades relativas ao aporte de informações sobre pescarias e cumprimento das normas que regem esta pescaria.

Sem qualquer levantamento estatístico oficial, Travassos indica que os dados relativos à pesca de atuns e afins tem sido obtidos “de forma precária e sem o devido controle de qualidade, gerando informações sub ou superestimadas da produção, com reflexos negativos nas declarações anuais das capturas que o Brasil faz à ICCAT”.

Como consequência, diz ele, os dados brasileiros para o período de 2012-2015 foram recebidos com restrições pelo Subcomitê de Estatística, do Comitê Permanente de Pesquisa e Estatística da ICCAT (SCRS). Estão em caráter provisório e necessitam de uma “profunda revisão”.

Outras críticas dos pesquisadores apontam para a extinção, em 2011, do Programa Nacional de Observadores de Bordo (Probordo) e a precariedade no funcionamento do Programa Nacional de Rastreamento de Embarcações Pesqueiras por Satélite (Preps) em vigor.

Todo país-membro da ICCAT deve manter um programa nacional de observadores de bordo, com uma cobertura mínima de embarque equivalente a 5% do esforço de pesca de cada uma de suas pescarias (espinhel, vara e isca viva e cerco). “Quanto ao Preps, o programa vem funcionando há cerca de três anos de forma precária, apresentando problemas técnicos e operacionais que impedem o alcance pleno de seus objetivos de monitoramento e controle da frota pesqueira nacional, incluindo a frota atuneira”, salienta o professor.

Travassos reconhece que, em 2015, o MPA fez um esforço para corrigir a questão, lançando um edital com apoio do MCTI/CNPq que liberaria R$ 11,7 milhões para selecionar propostas que equacionassem os problemas. Até agora, no entanto, apesar de um projeto ter sido aprovado em dezembro de 2015, até agora nenhum recurso foi liberado.

Sem perspectivas de mudança, os pesquisadores, que atuam em caráter voluntário, cruzaram os braços. “O SCC-AA não possui mais as condições mínimas necessárias para exercer suas funções, razão pela qual, decidiu, pela grande maioria de seus membros, paralisar todas as suas atividades a partir deste momento”. Assinam a carta outros 18 membros.

Fonte: http://seafoodbrasil.com.br/